A IA (Inteligênca Artificial) como alavanca para ‘renovar’ os processos de seleção

Na semana passada li um artigo sobre modelos operacionais inovadores versus renovadores, ou, segundo o autor, “o paradigma da primavera”.

O artigo falava sobre a inovação como a substituição do elemento inovado por uma nova versão, também condenada a passar por um processo de obsolescência para ser novamente substituída pela inovação seguinte.

Em vez disso, a ideia é tentar preservar a entidade, preservando a sua idiossincrasia e a sua história. Permite, avaliando de um ponto de vista romântico, o chamado “paradigma da primavera”, que ano após ano se renova, preservando as mesmas realidades (árvores, flores) que são, de facto, aquelas que lhe dão sentido (em comparação com uma flor sintética, por exemplo, que não tem nenhuma dessas características).

O mundo do recrutamento vive, como quase todos os setores, momentos de mudança motivados, entre outros fatores, por uma transformação dos modelos de vida e das expectativas das novas gerações. Passamos de uma abordagem em que a empresa era importante, para uma abordagem centrada no candidato. Um candidato extremamente exigente e que precisa de se apaixonar, motivar e fidelizar em cada projeto que lhe é oferecido.

Este contexto exige que as empresas reflitam, profundamente, sobre os novos processos de seleção, nos quais a tecnologia, e neste caso específico a inteligência artificial, deve ter um papel renovador e não inovador.

Esta nuance é importante porque todos somos bombardeados por discursos de inovação tecnológica na seleção de pessoal, nos quais, muitas vezes, procuramos usar a tecnologia para parametrizar as regras necessárias que possibilitem fazer o essencial: pessoas que selecionam pessoas.

A meu ver, é impossível conceber um processo de seleção bem-sucedido se não tiver o recrutador como seu centro nevrálgico, embora esse fato não implique que a tecnologia não seja um auxiliar essencial para a sua renovação.

Se desconstruirmos um pouco as etapas dos processos seletivos, vemos o valor diferencial que a inteligência artificial contribui nas etapas de triagem curricular de “hard skills”, especialmente para processos seletivos massivos, pois permite:

  1. Em primeiro lugar, entrevistar o maior número de candidatos possível, de forma que a oferta de trabalho seja realmente acessível a todas as pessoas que se inscrevem, facilitando a primeira parte do processo. Desta forma, é possível eliminar o chamado “efeito de frustração” que os candidatos sofrem quando se inscrevem nas ofertas dos portais de emprego e não obtêm resposta imediata às suas candidaturas, ou não recebem qualquer resposta. Neste sentido, os dados mostram que, utilizando a inteligência artificial, somos capazes de responder a 100% dos candidatos inscritos nas ofertas, bem como aumentar o número de potenciais candidatos em quase 50%, face aos processos tradicionais.
  1. Em segundo lugar, o uso de IA ajuda-nos a fornecer uma resposta valiosa a todos os candidatos de uma oferta. Neste ponto, é fundamental saber comunicar de forma transparente os porquês de uma possível rejeição. Da mesma forma, permite propor ao candidato alternativas noutros processos seletivos que maximizem as hipóteses de contratação, bem como ajudá-lo a identificar e treinar aqueles aspetos que fizeram com que não fosse selecionado.
  1. Em terceiro lugar, permite uma seleção mais sólida dos candidatos para a realização de entrevistas pessoais. Agora sim, os especialistas, podem avaliar as denominadas “soft skills”, bem como tentar motivar o candidato com o novo projeto que tem pela frente. Como seres humanos, necessitamos do contacto pessoal para estabelecer uma relação de confiança com os responsáveis pelo recrutamento perante um novo desafio profissional.

É importantíssimo que, nessa entrevista, o candidato concentre os seus esforços em defender o seu perfil profissional como sendo o ideal para a vaga em aberto e o selecionador inspire a pessoa que está a entrevistar.

Se analisarmos os dados, quando utilizamos a inteligência artificial nos nossos processos seletivos, conseguimos multiplicar por 2,5 os perfis finalistas.

Redefinindo a experiência do candidato

Estamos, claramente, perante um novo cenário em que estão a ser definidas as novas regras que deverão regular a relação entre o candidato e o recrutador. É um momento único em que a tecnologia é a nossa grande aliada para dotar os responsáveis ​​pela seleção das ferramentas necessárias para resgatar os “pecados tradicionais” do setor.

Precisamos da tecnologia como “braço extensível” do recrutador, para fazer com que o processo de seleção comece (e progrida) sob o seu controlo, seja qual for o dispositivo que ele utilize, utilizando técnicas como gamification, que permitem captar a atenção de um candidato, que procura, cada vez mais, rapidez na comunicação. É necessário, portanto, que possamos despertar o seu interesse para solicitar o máximo número possível de informações nos momentos adequados, mantendo sempre uma comunicação constante.

Tudo isto, criando um ambiente profissional e, ao mesmo tempo, porque não, descontraído e amigável.

Este tipo de modelos “figitais’, que apostam na tecnologia para valorizar a importância da entrevista pessoal entre o recrutador e o candidato, são os que irão garantir a conclusão com sucesso dos processos seletivos do futuro, aumentando a confiança do responsável pela seleção, como assessor de valor da carreira profissional dos candidatos.

Definitivamente, a tecnologia não deve ser vista como uma ameaça, mas sim como uma oportunidade para renovar totalmente os processos de seleção e deixar que surja a ‘nova primavera’, centrada nos dois únicos protagonistas, o candidato e o recrutador.

José Manuel Vázquez, Regional Leader de Eurofirms Pívot Spain.